alma
sf (lat anima)
1. Nome que exprime vagamente a
causa oculta dos movimentos vitais; princípio, força vital, princípio sensitivo
e intelectual, vida.
2. Princípio imaterial da vida,
do pensamento e da ação.
4. Substância incorpórea,
imaterial, invisível, criada por Deus à sua semelhança; fonte e motor de todos
os atos humanos.
5. Essa substância, quando
separada do corpo.
reencarnação
sf (re+encarnação)
1. Ato ou efeito de reencarnar.
2. Segundo muitas seitas
orientais e segundo o espiritismo, fenômeno em que a alma humana, desligada do
corpo pela morte, vai, após tempo mais ou menos longo, alojar-se em outro corpo
humano.
fim
sm (lat fine)
1. Termo, conclusão, remate.
2. Extremidade, limite de
espaço, extensão ou tempo.
3. Intenção, propósito.
“Ela disse adeus, e chorou,
já sem nenhum sinal de amor.
Ela se vestiu, e se olhou;
sem luxo, mas se perfumou.
Lágrimas por ninguém,
só porque, é triste o fim.
Outro amor se acabou.
Ele quis lhe pedir pra ficar;
de nada ia adiantar.
Quis lhe prometer melhorar,
e quem iria acreditar?”
Abriu os olhos. Breu total. Passos se aproximavam.
- Olá! Finalmente alguém para quebrar o silêncio. Estava
enlouquecendo por diversos motivos, entre os quais a solidão e o tédio. Como se
chama? De onde vem?
- A solidão é sempre uma questão... Bom, eu? Não me lembro.
Minha última memória remete a uma cena grotesca. Estava sozinha num campo
aberto a olhar o horizonte quando vejo um ponto se aproximar. O ponto tornou-se
reta, de reta a curva elíptica. Quando dei por mim estava cercada por uma víbora
enorme, em movimentos circulares ao meu redor, como se estivesse atrás da
própria cauda, e disse-me, na língua dos homens, mas de modo sibilante, algo
como:
"Esta vida, assim como tu vives agora e como a
viveste, terás de vivê-la ainda uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá
nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o
que há de indivisivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e
tudo na mesma ordem e seqüência - e do mesmo modo esta aranha e este luar entre
as árvores, e do mesmo modo este instante e eu própria. A eterna ampulheta da
existência será sempre virada outra vez, e tu com ela, poeirinha da poeira!
Queres isto ainda uma vez e inúmeras vezes?"
- Em pânico, pupilas dilatadas, coração ligeiro, cravei as
unhas nas palmas das mãos geladas, detive-me a pensar e, num segundo, ou foram
dias?, respondi negativamente. Passado o abalo vejo que não há sentido
evolutivo em reviver a mesma existência, uma vez que as aflições já terão
trazido suas lições e os sabores da vida já não serão novos, e reitero
racionalmente a escolha impulsiva. Retornando ao acontecido, uma vez dito o
“não” fui enceguecida por uma luz azul cobalto e a terra se abriu, ou fui içada
por braços invisíveis, e caí, ou subi, até aqui. Nada pregresso a este
acontecimento faz parte do meu repertório. Qual o seu nome? Como você chegou
aqui?
- Da última vez eu estava num ambiente gelado, antibiótico
fluindo em minhas veias, ouvindo o estertor da morte. Fechei os olhos para
piscar e, quando abri, estava tudo escuro. Este escuro. Vivi desde a
adolescência entre pés de nhácamo, plantados em casa. Sempre achei a fisiologia
das plantas atraente e me sentia poderoso ao conseguir maximizar sua produção
com a química das reações, controlando temperatura, luminosidade e nutrientes
do solo. Ver uma semente se transformar numa árvore de metro e meio em poucos
meses me trazia a sensação divina! Não sei se você sabe, mas nhácamo é uma
fruta suculenta com propriedades encantadas, deixada pelo deus Eagger para que
amplifiquemos nosso entendimento.
- Conheço o nhácamo, mas não é um fruto proibido? De onde
venho cada gota de orvalho sobre as folhas de um pé de nhácamo é a lágrima de
uma mãe cujo filho se perdeu entre as cores e sabores desta drupa.
- Não existe nada mais bonito que o som de fortes
determinações colidindo. Comer um fruto que é proibido você não acha
irresistível? Nesse fruto está escondido o paraíso, o paraíso! Ele conecta as
pessoas e traz leveza ao ambiente, enquanto aprofundamo-nos em nós mesmos e
naqueles que nos cercam. As conversas mais edificantes que tive foram
alternando nhácamo e risadas. A autoconsciência nos livra das demais
necessidades. Como vê, ele cobrou seu preço, e peguei-o conscientemente.
- Discordo, porém compreendo... Agora dize-me!: quem é você?
Onde estamos? Por que tenho a impressão de conhecê-lo?
- Fui muitos e não sou ninguém. A única coisa que aprendi,
desde que cheguei neste lugar, é a efemeridade da vida. Purgatório, Limbo,
Umbral, Grande Vertigem, independente do nome estamos em algum lugar e
encontramo-nos nele, entre os desistentes e os insistentes, não por acaso. Não
existe acaso, embora não me agrade o conceito de destino. Acredito mais numa
verdade intermediária, um caminho no meio das pontas, onde encontram os que
querem e os que fazem por onde. Àqueles que desperdiçam seus bens mais
preciosos, tempo e energia, as extremidades.
- Você realmente não sente a força dos astros? O influxo de
sua proximidade ou distanciamento, o desenho das estrelas cujo ligar traça
nossos desígnios? Sem identificar a origem da influência vivi suas
consequências. Tive uma ligação planetária, certa vez... Agora me lembro... – E
centenas de pirilampos apareceram para dançar no céu, deixando ambos os vultos
à mostra - Foi irracional e irrefreável! A mais elaborada razão sucumbia ao
magnetismo sem foco.
- Creio somente no mérito da chama interior, a enorme força
criativa que todos somos dotados. O homem lida imediatamente apenas com as suas
próprias representações, os seus próprios sentimentos e movimentos da vontade.
As coisas exteriores têm influência sobre ele apenas na medida em que os
ocasionam. Se o destino só existe para cegar a realidade, e se é o destino que
as estrelas nos dizem, então devemos destruí-las em si. Ouça a melodia das
estrelas esmagando. – Enquanto aponta para o céu os agora milhares de pontos
luminosos vão se extinguindo como luzes de velas sufocadas por apagadores. –
Aproxima-te! Sinta o fogo cuspido pelo meu coração e que corre através das
artérias, esquentando meus impulsos e nervos, e ouça as palavras acaloradas que
assolam argumentos alheios, coroando-me sempre a vitória, saibam eles ou não.
- Você... Preciso de um Sol para energizar-me, não um
fogaréu pra me queimar. A luz da fogueira é quimérica, fugidia. A dança das
suas chamas se faz convidativa e, quando chegamos perto de mais, somos captados
pelo hipnotismo das labaredas, e estas cobram nossa pele e carne para arder.
Entretidos, quando percebemo-nos, voltamos ao carbono, e os danos feitos são
irreparáveis. Aos sobreviventes a tez se recompõe, agora como couro,
inelástico, marcado como gado com ferro quente. “Vejam lá os incautos,
escondendo suas cicatrizes com sorrisos, infelizes!” dirão novamente, enquanto
sentem-se elevados. O Sol, entretanto, é possuidor de uma prodigalidade
inimaginável! Independente, caminha em todas as direções, de leste a oeste, com
seu sorriso cintilante, e dá abraços suficientemente calorosos aos que se
expõem; e as plantas ficam maiores para vê-lo passar; e os jacarés sequer
movem-se, boquiabertos, diante da sua grandeza. Quando ele atravessa o frio míngua,
a escuridão fica menos densa e as dores suportáveis; as doenças do corpo e da
mente diminuem, apavoradas, e vão embora!
- Lembrou de mim, então? Recordou que foste a flor mais
bonita do meu jardim? Cultivada com carinho e compostagem, gás carbônico e
beijinhos em quantidade ideal? Por muito tempo houve o engulho com as nossas
presenças, mas aquele livro findou e podemos recomeçar, ou reescrever. Ambiente
novo, brisa nova, amor antigo.
- Eu fui apaixonada por você como jamais imaginei ser capaz
e nunca duvidei do seu amor, mas hoje não sei se essa paixão foi por mim. Acho
que você foi apaixonado pelo amor que acreditou sentir. E eu? Não tenho nada a
ver com isso. É uma pena, mas aconteceu assim. Eu tive todos os sonhos com você
e hoje isso virou tristeza. É tão misterioso o nascer das lágrimas... Eu não
posso salvar aqueles que já se perderam. Só porque duas pessoas se amam não
significa que elas devem ficar juntas e, Deus, como te amei!... Non è possibile!
- Mas, mas, mas... Não, não é! Eu nunca machucarei você
novamente. Eu vou protegê-la! Lembra quando estivemos no litoral, com o vento
trazendo a maresia, e, sobre aquela grande rocha, limite de dois distritos, vimos
a lua e o sol juntos? O sol representa a alma, a lua a mente e a pedra o corpo.
Estavam todos alinhados conosco. Estamos ligados, jurados, por isso a sensação
de familiaridade. Uma pequena onda, gerada por uma pedrinha, um dia pode gerar
uma grande onda. We can work it out! Só o tempo dirá se estou certo ou errado e
temos todo o tempo do universo.
- A vontade, se não quer, não cede, é como a chama ardente
que se eleva com mais força quanto mais se tenta abafá-la. Cedi. Desisti de você.
Desisti de tentar. Nos vemos em outra vida. – E sentiu o peso de uma mão em seu
ombro direito. Ao olhar para o lado inicialmente viu dois olhos azuis que
tomaram o corpo de um senhor com barba, cabelos acinzentados, rosto sereno e
roupa clara. Teve a impressão de que uma luz branca brilhava atrás da figura e
das vestes do mensageiro, como se viesse através de um véu tênue.
Reconfortou-se ao reconhecê-lo – Vamos?! - e, juntos, brilharam até completarem
uma constelação.